terça-feira, 14 de outubro de 2008

O caso dos denunciantes invejosos

Professor Claudio Mitri

observe os pontos destacados no final do artigo

Introdução

O texto denominado “O caso dos denunciantes invejosos” é de autoria do professor estadunidense Lon Luvois Fuller, responsável pela cátedra de filosofia do Direito da universidade de Harvard, nos EUA. Fuller é autor do conhecido texto “O caso dos exploradores de cavernas”.

No texto dos “denunciantes invejosos”, Lon Fuller provoca nos leitores a discussão sobre as relações entre direito, moral e justiça a partir de um caso de um pequeno país fictício que, tendo vivido durante anos em relativa estabilidade política, sob um regime constitucional democrático, subitamente se vê em meio a uma grave crise econômica e distúrbios causados por conflitos entre diferentes grupos políticos, religiosos e econômicos.

Basicamente, a questão que se coloca dizem respeito à existência de leis injustas, à capacidade que o direito positivo tem de dissociar-se, às vezes, dos valores da sociedade e dos mandatos mais elementares de justiça. O problema colocado por Fuller cinge-se o tratamento que deve ser dispensado àqueles que obedeceram e se pautaram por essas regras. A dificuldade decorre da imposição de sanções ou reprimendas quando o “descompasso” entre o sentimento do povo e a lei só surge depois de um longo período durante o qual a impressão que se tinha era que tais leis contavam com aprovação popular.

Após narrar o caso, Fuller apresenta cinco diferentes soluções para a pergunta feita ao final: devem ser os denunciantes invejosos punidos? Por sua vez, Dimoulis acrescentou à tradução outras cinco opiniões.

Contexto jurídico-político

Depois de anos vivendo pacificamente num regime constitucional democrático, um pequeno país é tomado por uma grave crise política, econômica e institucional. Vários Grupos disputam o poder em meio ao sentimento de abandono e desespero da população. Ao final de um processo eleitoral no qual não faltaram denúncias de irregularidades (ameaças, falsificações etc.), é eleito para o posto de Presidente da República o chefe do partido denominado “camisas-púrpuras”, considerado um verdadeiro salvador da pátria.

Os camisas-púrpuras também elegem a maioria dos representantes para a Assembléia Nacional. Não há mudanças na constituição ou as leis e são mantidas as eleições periódicas, numa aparente normalidade democrática. No entanto, instala-se um regime de terror no país.

Juízes e funcionários que se recusassem a aceitar os abusos do governo são ameaçados, agredidos ou assassinados. O governo não respeita as leis existentes e nem aquelas que ele próprio edita. Opositores políticos são cassados e partidos políticos suprimidos. São criados regulamentos secretos e legislações de exceção.

Promulga-se uma lei concedendo anistia a todos que “tivessem cometidos atos em defesa da pátria”, por meio da qual todos os partidários dos camisas-púrpuras que estavam presos são libertados. De outro lado, são criadas leis retroativas para punir os inimigos do regime, ou ainda conferidas interpretações perniciosas às leis com a finalidade de encarcerar todos aqueles que representem uma ameaça aos planos de poder dos camisas-púrpuras.

Após anos de dominação, os camisas-púrpuras são derrotados e novamente instala-se um regime constitucional e democrático. Vários problemas decorrentes dos anos de desmando e terror devem ser enfrentados. Um deles é o problema dos denunciantes invejosos.

O caso dos denunciantes invejosos

Aproveitando-se do clima de perseguição e terror implantado pelos camisas-púrpuras, muitas pessoas denunciaram seus desafetos às autoridades movidas exclusivamente por inveja. Claramente esses denunciantes eram agentes do estado dos CAMISAS PÚRPURAS afinal tinham acesso ao governo. Um desses casos foi o de um sujeito que se enamorou por uma moça casada e decidiu denunciar o marido desta por um delito absolutamente banal, mas que fez com que o marido fosse processado e condenado à pena de morte.

Eram duramente punidas várias espécies de condutas, entre elas a crítica ao governo ou ao partido, mesmo em conversas particulares; a escuta de transmissões radiofônicas estrangeiras; a omissão de informar a perda de documentos no prazo de cinco dias; a posse de saquinhos de ovo em pó em quantidade superior à permitida etc.

Em alguns casos, as penalidades extremamente duras estavam autorizadas por regulamentos emergenciais; em outros casos, eram decorrentes da decisão de juízes regularmente constituídos.

Todavia, desmantelado o regime dos camisas-púrpuras, criou-se um problema político prestes a inflamar os ânimos da população, que clama pela punição dos denunciantes invejosos do forma tal que a solução deve ser decidida imediatamente.

Obviamente a tematica central do livro não resulta na prática dos denunciantes invejosos e sim na estreita relação da insuficiência do direito positivo em coibir atos lesivos de uma ditadura e ainda na relação clara e impura que os denunciantes tinham com o sistema vigente. Era óbvio que esses denunciantes se comportavam de tal forma estimulados pelo sistema.

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