quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Para evitar o pior

Para evitar o pior

Júlio Gomes de Almeida
De São Paulo

O Brasil está se atrasando demasiadamente em adotar ações em face à crise externa. O atraso se revela mais profundo porque a crise se desenvolve com velocidade e gravidade cada vez maiores. É natural que as autoridades queiram reunir todas as informações disponíveis para somente então se decidirem por determinadas ações de política econômica.

Como a situação atual é muito delicada, as autoridades estão como que "filtrando" as informações e ponderando o desencontro de avaliações antes de tomar decisões. Porém, dado o andamento da crise lá fora e os desdobramentos internos dela, os seguintes pontos já podem ser considerados com clareza:

1. O debate no Brasil sobre a causa da maior inflação, se tinha origem predominantemente "de fora" (preços de commodities) ou correspondia ao aquecimento da demanda interna, foi literalmente superado pelos acontecimentos externos que tanto deprimiram os preços de commodities com relação ao "pico" de preços de meados do ano, quanto, no plano interno, "travaram" o crédito doméstico e as expectativas de investir e consumir de empresários e famílias brasileiras. O Brasil deve reduzir desde já a sua taxa básica de juros, seguindo a medida adotada hoje pelos mais importantes bancos centrais do mundo.

2. Influência inflacionária no contexto atual poderá ter a desvalorização do Real que desde o início da crise vem sendo elevada demais. A desvalorização exagerada também potencializa a sensação de contágio brasileiro pela crise externa. Por gerar expectativas excessivamente pessimistas, uma ação muito forte de intervenção no mercado cambial é necessária para reduzir a desvalorização da moeda ao menos nessa etapa de aguda instabilidade dos mercados financeiros mundiais.

3. A restrição do crédito contratado com recursos externos por empresas brasileiras é total. A bem da verdade, essa restrição do crédito externo já se apresentava de forma parcial e com grandes oscilações desde agosto do ano passado quando a crise externa se explicitou, tendo sido agravada intensamente nos últimos três meses. Como na situação atual não é possível sequer nutrir uma perspectiva de retorno do crédito externo, o governo deveria anunciar que cobrirá integralmente com suas reservas ou outras fontes internas de seus bancos a demanda de crédito para exportação.

O governo já anunciou a disposição de financiar as exportações com recursos de suas reservas e o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) já ampliou suas linhas de financiamento ao giro de exportações, faltando anunciar um valor para os financiamentos correspondente à demanda atual. Cabe observar que para compensar perdas de fonte externas com financiamentos internos nos casos de investimentos e no crédito agrícola, o governo já agiu especialmente com ações do BNDES.

4. O crédito no Brasil travou não somente no que diz respeito às linhas com recursos externos, mas também para as demais linhas com recursos internos. O quadro ainda não é preciso, mas as informações são de que os aumentos de financiamentos às empresas estão bloqueados e mesmo as renovações de financiamentos antigos estão muito difíceis. No crédito pessoal e ao consumidor o aumento das taxas de juros e o encurtamento de prazo já são realidades. Ou seja, a forte restrição do crédito que se assiste em países como os EUA, se reproduziu aqui, embora os bancos brasileiros não tenham sofrido diretamente com a crise do "subprime".

Em outras palavras, a realidade é que o Brasil importou a crise externa de crédito. Isso significa dizer a restrição de crédito se não for minimizada deprimirá significativamente o crescimento já nesse trimestre final do ano e no ano que vem. É possível minimizar o problema, mas dificilmente ele poderá ser neutralizado. As medidas nessa área se somariam às iniciativas já tomadas para melhorar a liquidez dos bancos de menor porte, mas iriam muito além.

Duas ações são muito urgentes: a) liberação de parcela significativa do compulsório não remunerado dos bancos em contrapartida de operações de crédito para PMEs, crédito agrícola e crédito para giro de exportação; b) reforço das linhas de crédito nessas mesmas áreas e na área de crédito imobiliário do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal.

Nenhum comentário: